Representantes do Sindicato dos Trabalhadores da Saúde no Estado (Sindsaúde-ES) contestam as declarações do secretário de Estado da Saúde, Ricardo de Oliveira, que voltou a defender o modelo de terceirização dos hospitais estaduais em evento realizado nesta semana em Brasília. Para os sindicalistas, a contratação de Organizações Sociais, as OSs, tem levado em conta números, ignorando a qualidade do atendimento e a valorização dos servidores. Além disso, de natureza privada e teoricamente sem fins lucrativos, as entidades são alvo de suspeitas e investigação por desvios de verbas públicas e cabide de emprego tanto no Espírito Santo como em outros estados.
Nessa quarta-feira (22), Ricardo de Oliveira, em seminário sobre boas práticas de gestão, pegando como exemplo o último hospital capixaba terceirizado, o Infantil de Vila Velha (Himaba), disse que “o pronto-socorro foi reaberto e funciona 24 horas, todos os dias da semana; e que houve aumento de 40% nos atendimentos de urgência e emergência, de 13% nas internações, de 31% nas consultas e de 26% nos exames, além de acréscimo de 46 leitos, sendo 10 de saúde mental infanto-juvenil”.
O secretário destacou ainda que o setor privado não tem uma legislação que impede a velocidade na tomada de decisão na área da saúde, por isso, as OSs cumprem o papel de dar agilidade. “Essas entidades do terceiro setor têm muito mais facilidade e agilidade para tomar providências necessárias para a prestação de serviço público de saúde do que a administração direta”, explicou.
De acordo com o secretário de Comunicação do Sindsaúde-ES, Valdecir Gomes Nascimento, a posição do secretário de Estado da Saúde é completamente equivocada, uma vez que, até hoje, não existe efetivamente uma instituição que fiscalize as Organizações Sociais no Brasil, o que depende de aprovação do Congresso Nacional. Fruto disso, o que se vê são sucessivos escândalos de desvios de verbas e criação de verdadeiros cabides de emprego.
Valdecir cita como exemplo o caso dos irmãos Pelegrini, no Rio de Janeiro. Os irmãos Walter e Wagner Pelegrine, responsáveis pela organização social Biotech, foram presos e são acusados pelo Ministério Público de superfaturar contratos da organização social, que administrava hospitais da Prefeitura do Rio de Janeiro. No Estado, o Ministério Público de Contas (MPC-ES) emitiu parecer em que orientou pela suspensão de todos os contratos de aquisição de material hospitalar celebrados entre a Associação Evangélica Beneficente Espírito-Santense (AEBES), Organização Social gestora do Hospital Estadual Jayme Santos Neves, e o grupo empresarial familiar Pegurin Libório, por suspeitas de monopólio nas contratações.
No caso fluminense, um dos envolvidos no esquema de corrupção é da diretoria da OS Pró-Saúde, contratada pelo governo do Espírito Santo para gerir o Hospital Estadual de Urgência e Emergência, nova unidade criada para substituir o antigo São Lucas. “Não é designado um fórum para acompanhamento dessas terceirizações. Quem teoricamente fiscaliza é a Secretaria de Saúde, que tem total interesse no modelo e não é transparente. No Estado, esses hospitais se tornaram verdadeiras caixas-pretas”.
Valdecir explicou ainda que o Pronto-Socorro do Himaba sempre funcionou durante 24 horas, mas, por falta de interesse político da Sesa, que já visava a terceirização, não havia médicos para realizar os plantões aos finais de semana.
Já Cynara Azevedo, também diretora da entidade, reforçou que o secretário gosta de apresentar números para justificar o êxito das terceirizações, mas, na prática, a qualidade do atendimento despencou, incluindo o aumento de mortes, como as registradas na UTI Neonatal do Himaba.
No mesmo hospital, recentemente, a Cooperativa dos Ortopedistas realizou uma greve por falta de pagamentos. Por falta de entendimento, a OS IGH resolveu dispensar a cooperativa e contratar novos ortopedistas. A mudança, no entanto, trouxe novos problemas, uma vez que entre os novos profissionais não há um sequer que seja especialista em Pé Torto Congênito (PTC), o que simplesmente paralisou o tratamento com crianças com esse problema no hospital, que sempre foi referência no Estado nesse tipo de tratamento.
“Não estamos lidando com números e sim com vidas humanas. É preciso planejamento, mas o gestor precisa ter sensibilidade. Não estamos falando de uma oficina, de uma indústria ou de uma empresa. Temos que zelar pelo melhor atendimento e não fica contanto apenas a quantidade. Saúde não é mercadoria”, disse Cynara Azevedo.
Pacote de terceirizações
O Espírito Santo começou a adotar a gestão por OS em 2009, com o Hospital Estadual Central, e hoje o modelo está implantado em quatro grandes unidades estaduais, incluindo os hospitais São Lucas, Jayme Santos Neves e Infantil e Maternidade de Vila Velha (Himaba). O último deles foi o Himaba, em outubro de 2017.
Agora, a Sesa pretende ampliar a terceirização, por atacado, para outros seis hospitais estaduais, incluindo unidades do interior: Dr. Alceu Melgaço Filho, em Barra de São Francisco; Roberto Arnizaut Silvares, em São Mateus; Silvio Avidos, em Colatina; Antônio Bezerra de Faria, em Vila Velha; Dório Silva, na Serra; e Infantil de Vitória.