O Conselho Federal de Psicologia (CFP) divulgou, nesta terça-feira (23), uma nota contra a mudança promovida pelo Decreto presidencial Nº 9.926, de Jair Bolsonaro (PSL), que reduziu a participação da sociedade civil – inclusive de representantes das áreas de medicina e psicologia – do Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas (Conad), órgão que tem entre suas funções aprovar o plano nacional de políticas sobre o tema.
Criado em 2006, o Conad, que era composto por representantes de quatro esferas – governo federal (1); conselhos estaduais antidrogas (2); organizações, instituições e entidades da sociedade civil (3); e especialistas indicados pelo presidente do conselho (4) – perdeu os representantes das últimas duas áreas, sociedade civil e especialistas. O Conad passa a ser composto apenas por representantes do governo e dos conselhos estaduais antidrogas.
Para o Conselho Federal de Psicologia, “descaracterizado a partir do Decreto, o Conad agora aproxima-se mais de um grupo interministerial, em que não haverá contraponto às ações ou ideias apresentadas pelo governo, facilitando a aprovação de tudo o que for colocado para o grupo sem passar por discussões, que são a base do processo democrático. O CFP reitera a importância da participação da Psicologia, assim como de outros Conselhos profissionais, no Conad, que tem o objetivo de oferecer subsídios para uma discussão com base na produção científica do conhecimento nas mais diversas áreas. A nova medida torna os debates dentro do Conselho restritos às discussões mais baseadas em crenças do que no conhecimento científico”.
O CFP também publicou nota em junho deste ano, alertando para os efeitos da Lei 13.840/2019, que modifica a Lei de Drogas (11.343/2006), sancionada pelo governo federal, permitindo a internação involuntária de usuários sem a necessidade de autorização judicial, reforçando o modelo de abstinência e das comunidades terapêuticas em detrimento da Política de Redução de Danos e dos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Caps AD).
Gilmar Ferreira, do Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra, fez coro às críticas. Para ele, as mudanças constituem-se mais um retrocesso, que é retirar a sociedade civil e os profissionais da saúde, psicologia e assistência social do Conselho sobre drogas. “Isso torna essa política cada vez mais dominada e tratada como caso de repressão, punição e castigo e com intervenção policial, em vez de oferecer o olhar e serviço da ciência, saúde física e mental. Vai favorecer as comunidades terapêuticas e ao tratamento com viés religioso e fundamentalista”.
De fora
O decreto, publicado nessa segunda-feira (22) no Diário Oficial da União, exclui do conselho os assentos até então destinados a um jurista, indicado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); um médico, indicado pelo Conselho Federal de Medicina; um psicólogo, indicado pelo Conselho Federal de Psicologia; um assistente social, indicado pelo Conselho Federal de Serviço Social; um enfermeiro, indicado pelo Conselho Federal de Enfermagem; um educador, indicado pelo Conselho Federal de Educação; um cientista, indicado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência; e um estudante, indicado pela União Nacional dos Estudantes.
Também estão de fora profissionais ou especialistas, que podiam participar do conselho, indicados pelo presidente do Conad, como: um de imprensa, de projeção nacional; um antropólogo; um do meio artístico, de projeção nacional; e dois de organizações do terceiro setor, de abrangência nacional, de comprovada atuação na área de redução da demanda de drogas.
Conad governamentista
Com as mudanças, o Conselho Nacional de Políticas sobre Drogas continuará sendo presidido pelo ministro da Justiça e da Segurança Pública, Sergio Moro, mas composto por novos membros do governo, como o ministro da Cidadania, Osmar Terra, que passa a integrar o conselho.
Também da administração pública federal participam: Ministério da Defesa; Ministério das Relações Exteriores; Ministério da Economia; Ministério da Educação; Ministério da Saúde; Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; Agência Nacional de Vigilância Sanitária; secretário nacional de Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça e Segurança Pública; o secretário nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas do Ministério da Cidadania; um representante de órgão estadual responsável pela política sobre drogas; e um representante de conselho estadual sobre drogas.
Em maio, outro decreto de Bolsonaro alterou a composição do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), principal órgão consultivo do Ministério do Meio Ambiente (MMA), responsável por estabelecer critérios para licenciamento ambiental e normas para o controle e a manutenção da qualidade do meio ambiente. O colegiado contava com 96 conselheiros, entre membros de entidades públicas e de ONGs; agora terá 23 membros titulares, incluindo seu presidente, o ministro Ricardo Salles.