O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu, neste domingo (4), o piso salarial nacional da enfermagem e deu prazo de 60 dias para entes públicos e privados da área da saúde esclarecerem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços. A decisão é proveniente de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) movida pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais, Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde), que questionou a constitucionalidade da lei 14.434/2022, que estabelece o piso.
De acordo com o STF, Barroso considerou mais adequado que o piso não entre em vigor no momento até que sejam feitos os esclarecimentos solicitados, uma vez que existe alegação por parte da CNSaúde de que haverá piora na prestação do serviço de saúde principalmente nos hospitais públicos, Santas Casas e hospitais ligados ao Sistema Único de Saúde (SUS), já que apontam possibilidade de demissão em massa e de redução da oferta de leitos.
O ministro afirma que o Legislativo e Executivo não cuidaram das providências para viabilizar a absorção dos custos pela rede de saúde. “No fundo, afigura-se plausível o argumento de que o Legislativo aprovou o projeto e o Executivo o sancionou sem cuidarem das providências que viabilizariam a sua execução, como, por exemplo, o aumento da tabela de reembolso do SUS à rede conveniada. Nessa hipótese, teriam querido ter o bônus da benesse sem o ônus do aumento das próprias despesas, terceirizando a conta”, disse.
A decisão cautelar do ministro na ADI, conforme informa o STF, será levada a referendo no Plenário Virtual nos próximos dias, mas não é especificada a data precisa. A norma estabeleceu piso salarial de R$ 4.750 para os enfermeiros; 70% desse valor aos técnicos de enfermagem; e 50% aos auxiliares de enfermagem e parteiras. Pelo texto, o piso nacional vale para contratados sob o regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e para servidores das três esferas – União, Estados e Municípios -, inclusive autarquias e fundações.
Serão intimados a prestar informações no prazo de 60 dias sobre o impacto financeiro da norma os 26 estados e o Distrito Federal, a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) e o Ministério da Economia. Já o Ministério do Trabalho e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) terão que informar detalhadamente sobre os riscos de demissões. Por fim, o Ministério da Saúde, conselhos da área da saúde e a Federação Brasileira de Hospitais (FBH) precisarão esclarecer sobre o alegado risco de fechamento de leitos e redução nos quadros de enfermeiros e técnicos.
Entre outros pontos, a CNSaúde alegou que a lei seria inconstitucional porque a regra que define remuneração de servidores é de iniciativa privativa do chefe do Executivo, o que não ocorreu, e que a norma desrespeitou a auto-organização financeira, administrativa e orçamentária dos entes subnacionais, “tanto por repercutir sobre o regime jurídico de seus servidores, como por impactar os hospitais privados contratados por estados e municípios para realizar procedimentos pelo SUS”.
A CNSaúde também afirmou que o texto foi aprovado de forma rápida e sem amadurecimento legislativo na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, onde não passou por nenhuma comissão, mesmo diante da relevância da medida e de seus impactos significativos. Conforme a confederação, a aplicação da lei pode aumentar o desemprego, gerar a falência de unidades de saúde ou aumento de repasse de custos no serviço privado, entre outros problemas.
O Senado, a pedido do STF, já se posicionou sobre o assunto. A Casa de Leis se posicionou pela constitucionalidade do piso. Também tiveram o mesmo posicionamento a Câmara dos Deputados e a Advocacia Geral da União (AGU). “São posições importantes que reforçam nossa convicção da legalidade absoluta do piso salarial”, disse Contarato em suas redes sociais.
O senador Fabiano Contarato (PT) afirmou, em suas redes sociais, que lamenta a posição do STF. “O STF, ao qual recorreu o setor patronal, não pode desprezar Lei e Emenda à Constituição aprovados por amplíssima maioria do Congresso. Estou empenhado para que o Tribunal, na via recursal, reverta essa decisão!”, disse. O parlamentar prossegue dizendo que os médicos têm piso quatro vezes maior “e o Judiciário jamais vetou esta medida”. “Os enfermeiros conquistaram a duras penas esse direito por decisão do Poder Legislativo e do Poder Executivo, em ampla e democrática mobilização”, afirma.
Diante da Adin ingressada no STF, Contarato já havia protocolado ofício solicitando a concessão de uma audiência pública. O parlamentar, por meio do documento, endereçado ao ministro Barroso, também se colocou à disposição para fazer a defesa da matéria no momento do julgamento. No ofício, Contarato destacou “a deliberação do projeto incluiu debates, discussões e processos de construção de acordos políticos, que ocorreram em ambas as Casas do Congresso Nacional, obedecidas as regras definidas e expressas na Constituição e nos seus Regimentos Internos”.