Um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e do Instituto Jones dos Santos Neves (IJSN) revelou dados sobre comorbidades, óbitos e sintomas de Covid-19 entre crianças, adolescentes e jovens em idade escolar, que apontam para a necessidade de reformular as premissas e protocolos voltados à reabertura de escolas no Espírito Santo.
O grupo analisou dados dos inquéritos sorológicos relacionados à população de 2 a 22 anos e do Painel Covid-19, na faixa etária de 0 a 19 anos.
No primeiro caso, chamou atenção a ausência de sintomas em 35% das pessoas de 2 a 22 anos entrevistadas e o fato do sintoma mais comum ser a tosse (40%), seguido de febre, presente em apenas 26% dos entrevistados. “Então aquela ideia de rastrear pela temperatura as crianças pode não ser um bom marcador”, alerta a doutora em epidemiologia e professora da Ufes, Ethel Maciel.
Também chamou atenção o percentual de comorbidades nessa faixa etária: 15% com asma, 11,4% com hipertensão, 8% com obesidade, 5% com diabetes e quase 4% com doenças cardíacas, sendo que a hipertensão e a obesidade foram as comorbidades mais encontradas entre as pessoas que testaram positivo.
Entre as positivas, também destacou-se o fato de 35% não apresentarem nenhum sintoma. “Quando pensa em retorno pra escola, isso é uma questão que preocupa muito, os assintomáticos”, ressaltou a pesquisadora.
Comorbidades em apenas 17% dos óbitos
A segunda análise, do Painel Covid-19, revelou a confirmação de 17 óbitos entre pessoas de 0 a 19 anos. Nesse universo, a maioria, mais de 62%, é de cor parda, havendo com pouca diferença entre masculino e feminino.
A dificuldade respiratória foi o sintoma mais importante, em 70% das que pessoas que foram a óbito. Mas apenas 17% tinham comorbidades e 23% alguma deficiência, e somente 52% ficaram internados.
“É um sinalizador importante. Das crianças, adolescentes e jovens que morreram, só um percentual pequeno tinha comorbidade e deficiência”, acentua Ethel, pra quem os dados mostram também que é possível haver dificuldade de acesso a diagnóstico para um grupo importante. “Esse grupo não era prioritário pra testagem, o que é um sinalizador que a gente tem que repensar as políticas públicas”, apontou. O Painel tem ainda 40 mortes que foram descartados por outras causas e “que merecem uma investigação melhor”, sublinhou.
Para Ethel, os resultados das análises não descartam a necessidade de realizar o inquérito da comunidade escolar, como é cogitado pela Secretaria de Estado da Saúde (Sesa). “O inquérito escolar é importante para entender como a doença se espalhou tanto em estudantes quanto em professores. Porque no painel a gente vê de forma mais explícita a desigualdade do diagnóstico. Tem mais brancos que fizeram testes laboratoriais do que pretos e pardos. Como essa não é uma faixa etária prioritária para testagem [pelo Estado], somente as pessoas em estado mais grave ou internadas, é que foram testadas. Revela desigualdade no acesso ao diagnóstico”, reivindica a epidemiologista.
Perfis analisados
A análise dos inquéritos sorológicos estudou os dados de 1.693 pessoas de 2 a 22 anos, abrangendo faixas etárias escolares do infantil ao universitário. Desse total, 104 (6,1%) testaram positivo, sendo que foi visto um aumento do número de positivos a cada uma das quatro fases do primeiro inquérito e a primeira fase do segundo inquérito, saindo de 2% de positivos para 9,5%, no dia 21 de junho. Não houve diferença importante de gênero, raça ou número de moradores por domicílio entre aqueles que deram positivo e negativos.
Já o estudo das pessoas de 0 a 19 anos testadas para o Painel Covid encontrou 27.351 registros, no período de 17 de fevereiro a 20 de agosto. Desses, 6.099 foram confirmados com Covid-19 e 9.190 testaram negativo para a doença, havendo ainda um grupo grande, mais de 12 mil pessoas, ainda suspeitas. Entre os 15.289 descartados ou confirmados, a febre e a tosse foram os sintomas mais frequentes.
A maioria dos positivos foi na faixa etária entre 10 e 19, entre a raça branca e entre moradores do interior do Estado. “Esse resultado pode sinalizar que as pessoas pretas e pardas estão tendo mais dificuldade no diagnóstico”, salienta Ethel.