O juiz Mário da Silva Nunes Neto, da 3ª Vara da Fazenda Pública de Vitória, durante audiência de conciliação realizada na tarde desta quinta-feira (16), decidiu acolher a sugestão do Ministério Público Estadual (MPES) para suspender a Ação Civil Pública (ACP) por 90 dias e criar uma Comissão Mista que passa a assumir as tratativas entre o governo do Estado e as associações ligadas à Polícia Militar.
A Comissão Mista, segundo os termos da audiência de conciliação, terá o compromisso de pautar as demandas dos policiais militares e a possibilidade do governo do Estado em atendê-las. A Comissão, por sugestão do promotor Paulo Panaro, será composta por representantes da Procuradoria Geral do Estado (PGE), das secretarias de Direitos Humanos e Fazenda, das associações militares e do próprio MPES.
Ficou acordado ainda que o governo Estado poderá indicar, no prazo de cinco dias, outras secretarias para compor a comissão. A primeira reunião foi agendado para o dia 28 de março, na sede do Ministério Público Estadual.
O presidente da Associação dos Oficiais Militares (Assomes), major Rogério Fernandes Lima, afirmou após a audiência que a Assomes trabalharia para retomar acordos anteriormente celebrados em reuniões realizadas durante a paralisação. Ele destacou que a associação incluirá na pauta lei de promoção dos oficiais. O major também disse que as propostas discutidas na Comissão Mista serão sempre submetidas aos policiais.
Firmaram os termos definidos na audiência os representantes da secretaria de Direitos Humanos, da Procuradoria Geral do Estado (PGE); da Associação dos Cabos e Soldados (ACS-PMBM), Associação dos Subtenentes e Sargentos da Polícia e Bombeiro Militar (Asses), Associação dos Bombeiros Militares (ABMES) e a Associação dos Oficiais Militares (Assomes) e da Associação dos Militares da Reserva, Reformados da Ativa da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros Militar e Pensionistas de Militares (Aspomires), além do MPES.
Acordo não reconhecido
Enquanto o acordo era fechado, a alguns metros da 3ª Vara da Fazenda Pública de Vitória, familiares e mulheres dos policiais militares, que também estavam convocadas para a audiência, faziam um protesto em frente ao Palácio Anchieta. O ato foi um recado ao governo: o movimento de mulheres não reconhece o acordo selado na audiência de conciliação.
As mulheres lembraram que o juiz (Mário da Silva Nunes Neto) que conduzia a audiência de conciliação era mesmo que durante a paralisação deferiu a Ação Civil Pública interposta pelo governo do Estado para desobstruir a todo custo os quartéis. Nunes Neto estabeleceu, à ocasião, multa diária de R$ 10 mil e imputação de crime de desobediência às mulheres que insistissem em permanecer bloqueando as unidades da PM. “Como podemos fazer um acordo com um juiz que nos perseguiu”, questionou uma das mulheres.
Juiz barra CUT
O advogado da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Rafael Pimentel, que participou da mediação inicial feita pelo Ministério Público do Trabalho (MPT-ES), que pôs fim à ocupação dos quartéis, no último dia 4, foi barrado de participar da audiência de conciliação na Justiça. O magistrado alegou que a entidade sindical não era parte no processo, desta forma, o advogado só poderia participar caso fosse representante do grupo de mulheres. Para representar, no entanto, ela precisaria identificá-las.
Embora barrado, o advogado disse que a CUT, caso seja desejo das mulheres, continuará assessorando o movimento.
A CUT divulgou uma nota (abaixo) sobre a decisão da Justiça de barrar a entidade sindical de particpar da audiência.
Protesto
O grupo de mulheres fechou, alternadamente, os dois sentidos da avenida Mascarenhas de Moraes, na altura do Palácio Anchieta, Centro de Vitória, a partir das 15 horas desta quinta-feira.
Durante o protesto, as mulheres gritavam palavras de ordem contra o governador Paulo Hartung (PMDB). As rimas quase sempre destacavam a falta de interesse do governo em dialogar com o movimento. Elas também pediam aos motoristas e pedestres que fossem solidários às demandas da PM.
As mulheres que participavam do protesto também fizeram questão de reafirmar que as associações militares não representam o movimento que paralisou a PM por 22 dias no Espírito Santo. Elas disseram ainda que a audiência de conciliação era na verdade uma cilada. “Eles queriam que fôssemos à audiência para nos identificar e punir nossos maridos”, disse uma das mulheres que preferiu não se identificar.
O protesto, que foi pacífico, seguiu até as 18 horas. Agentes da Guarda Municipal de Vitória organizaram o trânsito no local, após negociarem a liberação de uma das faixas da avenida sempre quando semáforo estava verde para os veículos.
Comunicado à sociedade capixaba
A Central Única dos Trabalhadores do Espírito Santo informa à sociedade capixaba que na audiência de “mediação” do dia 16/03/2017, solicitada pelo MPES junto ao juiz da 3ª Vara da Fazenda Pública Estadual de Vitória na Ação Civil Pública – ACP n.º 0003310-50.2017.8.08.0024, teve negado seu pedido de ingresso nos autos e de participação na “mediação”.
A ACP interposta tem como único objeto desobstruir a frente dos quartéis e teve liminar deferida pelo juízo impondo a identificação das mulheres e parentes dos policiais com a aplicação de multa diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e imputação de crime de desobediência.
Na data de cumprimento da liminar nenhum manifestante foi identificado e a CUT/ES já havia alertado ao juiz do processo em 14/03/2017 que fica comprometida uma “mediação” considerando a exigência do MPES de identificação dos manifestantes onde paira uma penalidade tão desproporcional e com única finalidade de impedir e perseguir manifestações sociais que desagradam o governante momentâneo.
Talvez a sociedade imagine porque nenhum manifestante se fez presente na audiência. O único objetivo do MPES é perseguir, punir os militares e suas famílias por reivindicar melhores condições de vida e profícuo trabalho prestado à sociedade capixaba.
Causa estranheza a decisão do juízo da 3ª Vara da Fazenda Pública de Vitória, pois ao mesmo tempo em que nega a participação da CUT/ES, autoriza a participação das Associações de Policiais que também não fazem parte do processo.
Causa estranheza impedir a CUT/ES de participar da “mediação” quando foi esta a responsável por reabrir o canal de diálogo entre movimento horizontal de mulheres e o governo do ES através da mediação do MPT/ES, TRT/ES e DPU/ES.
Causa estranheza que o MPES tenha suscitado sua competência para conduzir as negociações através do Conflito de Atribuição n.º 1.00.000.004000/2017-80 – afastando o MPT/ES – e ao mesmo tempo em que confessa na ACP sua falta de isenção para conduzir a mediação, impedindo que a mesma fosse iniciada junto ao MPT/ES e omitindo a sociedade capixaba a diferença entre “competência de jurisdição” e “capacidade de mediação”.
Causa estranheza que o MPES tenha interposto diversas Ações visando punir o movimento social e NENHUMA AÇÃO para apurar as condições de trabalho dos Militares ou as denúncias das mulheres de perseguição pelo governo aos militares com abertura de Processos Administrativos e de Transferências de militares para o interior do ES visando prejudicar aos policiais e suas famílias.
Como “dialogar” em um processo judicial em cuja única finalidade é identificar o movimento social para aplicar multa e imputar crime?
Como “dialogar” excluindo a CUT/ES que representa o movimento sindical de trabalhadores celetistas e estatutários no Estado do Espírito Santo e cujo único interesse é possibilitar a pacificação social e evitar novas paralisações no setor de segurança pública do ES?
Tanto na atitude tomada pelo poder judiciário em excluir a CUT/ES, quanto na atuação do MPES fica claro para a sociedade capixaba que a única intenção é punir e perseguir as mulheres que ousaram defender suas famílias.
Um Estado que não gosta de mulheres exercendo sua cidadania.
Um Estado que não gosta de mulheres que defendem suas famílias.
Um Estado que trata seus militares e suas mulheres como criminosos e cujo único pecado foi denunciar as condições de vida e trabalho daqueles que diariamente colocam suas próprias vidas em risco para defender a sociedade capixaba.
Enquanto o movimento de mulheres, parentes e amigos da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo entenderem que a presença do movimento sindical é importante, a CUT
e seus sindicatos filiados estarão ladeados aos policiais e suas mulheres para reivindicar condições dignas de trabalho.
Vitória, 16 de março de 2017
CUT-ES – Central Única dos Trabalhadores Espírito Santo