Entidades afirmam que recrudescimento, punitivismo e castigo são marcas da atual gestão
A publicação da Instrução de Serviço (IS) Nº 0326, de 15 de outubro, que regulamenta o novo uniforme dos agentes socioeducativos com características de agentes do exército, provocou reação do Comitê Popular de Proteção dos Direitos Humanos no Contexto da Covid-19. Composto por fóruns, sindicatos, movimentos sociais, associações e outras entidades da sociedade civil organizada, o Comitê divulgou uma carta na qual afirma que essa medida traz “um enorme simbolismo de que a socioeducação para o atual governo é letra morta e que o recrudescimento, punitivismo e o castigo estão sendo consagrados como marcas da atual gestão”.
O Comitê recorda de iniciativas que, segundo o grupo, também mostram que essas são de fato marcas do governo Renato Casagrande (PSB). Uma delas é a Instrução de Serviço Nº 0661, de agosto de 2019, que dispõe sobre e a utilização da Tecnologia Não Letal (TNL), “cujo conteúdo viola os princípios consagrados Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA [Lei 8069/90] e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo [Lei 12594/2012]”.
E, ainda, a equiparação dos agentes socioeducativos aos policiais penais, o que considera “um retrocesso e violação das diretrizes e metas do Plano Estadual de Atendimento Socioeducativo do Estado do Espírito Santo [2014] que visam à superação da tradição correcional-repressiva, inclusive estabelecendo como ações ampliação da quantidade de servidores efetivos do Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases), de acordo com os parâmetros do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), e realização de processos seletivos de agentes socioeducativos priorizando um perfil educador”.
A carta destaca que o Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH) e o Comitê Estadual pela Erradicação da Tortura (Cepet), em nota conjunta, solicitaram ao Iases a suspensão do uso da TNL “por considerar que a medida viola flagrantemente o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] e o Sinase e representa um enorme retrocesso à socioeducação, com danos irreparáveis aos adolescentes sob custodia do órgão”. Em resposta, segundo o grupo, a autarquia respondeu que “não poderia suspender a medida, pois o procedimento sempre foi adotado sem normatização”.
“A nossos olhos a resposta confirma que o órgão gestor decidiu regulamentar uma medida praticada à margem da lei, sem normatizar em prática estatal e sem amparo legal”, diz o Comitê. Tudo isso, acredita o grupo, “corrobora com as medidas legislativas que vêm sendo propostas e debatidas na Assembleia Legislativa”, como o projeto de liberação do porte de armas de fogo para agentes socioeducativos, que segundo o grupo, foi o primeiro a ser apresentado em 2019.
Recentemente, afirma o Comitê, foi apresentado um projeto que libera armas de fogo para outras categorias, como agentes penitenciários, policiais aposentados e com financiamento subsidiados pelo próprio governo do Estado. “O momento é de pandemia, fenômeno planetário que aflige e mata pessoas em todo o mundo. É preciso ter solidariedade e lançar mão do precioso tempo de cada um de nós para lutar pela vida, contra o genocídio da juventude negra, pelo desencarceramento e contra a ampliação da segregação de adolescentes. Nós repudiamos a construção de novas unidades socioeducativas de internação, especialmente em virtude dos dados demonstrarem que não há demanda para tal ação”.
O Comitê irá entregar a carta para o governador Renato Casagrande, requerendo que seja interrompido “esse processo de militarização do sistema socioeducativo e que se cumpra o Plano Estadual de Socioeducação criado e pactuado pelo Sistema de Garantia de Direitos com efetivação das metas e ações objetivas ali dispostas”.