sexta-feira, setembro 20, 2024
24.9 C
Vitória
sexta-feira, setembro 20, 2024
sexta-feira, setembro 20, 2024

Leia Também:

Um legado indestrutível

Luiz Sérgio Aurich*
 
A segurança pública, indiscutivelmente, é, nos dias de hoje, um dos grandes tormentos da sociedade brasileira, em especial para os habitantes dos grandes aglomerados urbanos. A criminalidade e a violência açoitam a todos deixando-nos a sensação de que a cada dia aumenta mais a despeito dos esforços de todos os níveis governamentais.
 
Nos idos de 1985, em pesquisas realizadas pelo IBOPE/Isto É, a segurança pública ficava atrás apenas do item alimentação quando a pergunta era referente à prioridade dos moradores das grandes capitais brasileiras.
 
No Espírito Santo, já em 1989, o governo do Estado contratou uma equipe técnica para realizar um diagnóstico sobre a segurança pública e, paralelamente, indicar caminhos a seguir. Foi o primeiro ato do Estado nessa direção, podendo ser reconhecido como a primeira ação governamental organizada na segurança pública que desdobrou-se até 1993, sendo digno de nota a legislação básica da Polícia Civil com novos efetivos e carreira, novos efetivos para a Polícia Militar permitindo ampliação de suas unidades de serviços, as obras das delegacias de Vila Velha, Campo Grande, Serra, entre outras, o anexo da Casa de Detenção, os presídios de Linhares e de Cachoeiro de Itapemirim, a nova sede da Polícia Técnica na antiga EMFORMA, a modernização da emissão da carteira de identidade, a aquisição de farto equipamento, ambas as corporações policiais receberam uma legislação salarial nova criando-se uma isonomia entre as mesmas, para citar as mais importantes.
 
Pareceu naquela oportunidade o caminho certo. Como é falado por alguns, foram muitos ovos e pouco cacarejo, bem típico daqueles que juntos deram execução a todos esses empreendimentos.
 
O que se fez ficou como um legado para as novas gerações de policiais e, até hoje, continuam existindo como um marco silencioso. Leis, obras e unidades policiais. Quem não conhece o Regimento de Cavalaria, a Companhia Florestal e a Escola de Oficiais de nossa Polícia Militar? Quem não vê trabalhando a nova geração de investigadores, escrivães e delegados da nossa Polícia Civil? Quais policiais, de ambas as corporações, não conhecem a lei salarial do sete e meio?
 
Um marco silencioso, mas, indestrutível.
 
Tiveram a seguir novos rumos dados à segurança pública.
 
Surgiram novas ideias, saiu-se do tradicional.
 
Algumas ações antigas tomaram novas roupagens e tivemos muito marketing.
 
Devo reconhecer, no entanto, que muita coisa boa foi feita.
 
A maior referência é, sem dúvida, a intervenção no sistema penal e os enormes investimentos feitos no sistema carcerário de nosso Estado, que sempre será uma dívida da sociedade capixaba a plêiade de oficiais de nossa Polícia Militar que na administração passada, com sacrifícios pessoais enormes, construíram todo aquele patrimônio.
 
Hoje se fala em planos e ações na área da segurança impulsionados pelo desconforto que a criminalidade continua a proporcionar. Não esta fácil apresentar nada novo.
 
Alguma coisa boa pode estar vindo por aí. Espero que o diagnóstico tenha sido preciso e fundamentado em verdades.
 
Mas, um grande problema da segurança, apesar de constantemente ser assinalado em nossos jornais, revistas e programas televisivos, não tem diagnóstico claro e não é enfrentado com propriedade.
 
Qual é esse grande problema que aparece com tanta nitidez, que é claro como o sol em dia de verão e, todos resistem em não ver? A existência do cabo e do soldado na Polícia Militar.
 
Não há na segurança pública elementos mais importantes, sem deméritos aos demais, do que o soldado e o cabo da Polícia Militar. São esses profissionais que no dia a dia das cidades, bairros, ruas, parques, mercados, e todos os logradouros públicos, se fazem presentes, garantindo nossa segurança. São eles que fazem o primeiro contato em qualquer ocorrência policial. São os que nos socorrem em caso de um acidente e nos conduzem aos hospitais públicos para o primeiro atendimento médico.
 
A ação desses homens é decisiva. Em nossas madrugadas, são eles que representam o Estado.
 
Têm que julgar como um desembargador, conciliar como um político e, negociar como um diplomata.
 
Somos todos dependentes de suas ações.
 
E eles?
 
Infelizmente, eles têm a maior carga horária de trabalho do que qualquer servidor público brasileiro e trabalham no ambiente de maior estresse ao qual pode ser submetido um profissional.
 
São estigmatizados, moram na periferia, convivem diuturnamente com a criminalidade e suas famílias ficam permanentemente expostas, vulneráveis aos revides endereçados a eles.
 
Deveriam ser considerados super-homens. Não são. São seres humanos como todos nós.
 
É a única categoria de policiais que não tem carreira. Não tem futuro na ativa e, percebem a pior remuneração devida aos policiais.
 
Fundamentais para a segurança de todos nós, ignorados por todos. 
 
Essa é a situação dos soldados e cabos da Polícia Militar em todo o Brasil.
 
É remendo sobre remendo na tentativa de salvá-los.
 
Escalas extras para remunerá-los, sobrecarregando sua carga de trabalho.
 
Atividades externas como complementação salarial.
 
Sempre alvo de alguma mentira política.
 
Alguns chegam a trabalhar 56 horas semanais oficialmente e, em suas folgas, saem à procura de serviços extras para suprirem sua renda mensal.
 
Matam-se, mas são considerados criminosos impiedosos e massacrados perante a opinião pública. Quando morrem, caem quase de imediato no esquecimento. Não existe um soldado ou cabo da Polícia Militar vítima da criminalidade que frequentem as permanentes listas de vítimas do crime em nosso Estado.
 
A pressão sobre eles é enorme na proporção do crescimento da criminalidade.
 
O que fazer?
 
Reconstruir, urgentemente e com coragem, a presença dos soldados e dos cabos na Polícia Militar seria, sem nenhuma dúvida, o maior investimento que um governo poderia fazer nos dias de hoje na segurança pública.
 
Superaria qualquer plano milagroso. Daria resultados que nenhum trabalho de marketing apresentaria.
 
Um legado para o futuro que, também, seria indestrutível.
 
*Luiz Sérgio Aurich é coronel da Reserva da Polícia Militar  

Mais Lidas