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Fórum de debates defende o fortalecimento dos direitos dos trabalhadores

Fotos: Gustavo Louzada/Porã

O Sindicato dos Técnicos Industriais do Estado (Sintec-ES) promoveu nesta sexta-feira (8) o I Fórum de Debates sobre a Reforma Trabalhista e Previdenciária no auditório do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes). A atividade teve a participação do senador Paulo Paim (PT-RS) que apresentou o quadro de riscos aos direitos trabalhistas presente nas matérias que tramitam no Congresso Nacional que atacam frontalmente os direitos adquiridos ao longo de 100 anos.

Além do senador, participaram do fórum a desembargadora Ana Paula Tauceda, o Tribunal Regional do Trabalho no Estado (TRT-ES); a representante da Federação Nacional dos Técnicos Industriais (Fentec) Zilmara Alencar; Luiz Fernando Barbosa dos Santos, da Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB); o procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho no Estado (MPT-ES), Estanislau Tallon Bozi; e o advogado especialista em direito previdenciário, José Roberto Lopes dos Santos.

Paim tem percorrido todos os estados do País participando de fóruns sobre as reformas trabalhista e previdenciária e sobre os projetos que tramitam no Congresso que retiram direitos dos trabalhadores. Atualmente são mais de 63 matérias propostas que atacam direitos, que vão desde a que permite a terceirização das atividades-fim das empresas, passando o pela suspensão da Norma Regulamentadora 12 (NR-12) até a que estabelece o negociado sobre o legislado.

O senador ressaltou que este é o pior Congreso de todos os tempos. Ele lembrou que Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) em primeiro momento tinha listado cerca de 50 projetos que afrontam os direitos dos trabalhadores, hoje já são mais de 60 matérias que trazem prejuízos aos trabalhadores.

Um dos principais deles é o Projeto de Lei Complementar (PLC) 30/2015, que tramita no Senado e universaliza a possibilidade de terceirização. Paim lembrou que percorreu os 27 estados e em todos o projeto foi rejeitado, através da Carta contra a Terceirização. A matéria regulamenta a terceirização até mesmo nas atividades-fim. “Significa que não teremos mais metalúrgicos em empresas do setor, não teremos mais professores em escolas, bancários em bancos, comerciários no comércio que todos serão associados de instituições que mandam funcionários para aquela empresa metalúrgica, para aquele comércio, para aquele banco ou para aquela escola”, salientou ele.

O senador ressaltou que de cada cinco mortes no trabalho, quatro acontecem com trabalhadores terceirizados; de cada dez acidentes, oito acontecem em terceirizadas; os trabalhadores ganham, em média, de 70% a 25% a menos do que aqueles da empresa tomadora de serviço – ele apontou para a diferença nos percentuais em cada estado. “O terceirizado, além de tudo, não tem direito ao mesmo vale-transporte que o trabalhador da empresa matriz tem, nem o mesmo tíquete alimentação, 80% das ações na Justiça, proporcionalmente, vêm de empresas de trabalhadores terceirizados”.

Outro projeto que Paulo Paim relata é o que regulamenta e Emenda Constitucional (EC) 81/2014, o PL 432/2013, que define o conceito de trabalho análogo ao escravo. Ele pretende fazer uma conferência nacional para escrever uma Carta à Nação repudiando o projeto e depois apresentar o relatório a partir de setembro deste ano. Para o senador, o trabalho escravo não se regulamenta, mas se proíbe.

O pior projeto para o trabalhador, na opinião do senador, é o PL 4.962/16, que estabelece a prevalência do negociado sobre o legislado. Ele explicou que, a partir do projeto, passa a valer o que foi negociado pelas partes o que, para o parlamentar, é pior que a terceirização. “Calcule – em época de desemprego como essa – o camarada chega em uma empresa e diz que fecha em mil empregos uma empresa em troca de, por exemplo, os trabalhadores abrirem mão do décimo terceiro salário ou de não receber essa ou aquela vantagem”, disse ele, completando que, na visão dele, isso é rasgar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ele concluiu dizendo que os direitos dos trabalhadores, fruto de uma história de luta eterna, está em xeque neste momento.

Debate

A desembargadora Ana Paula Tauceda Branco (foto à esq.), do Tribunal Regional do Trabalho no Estado (TRT-ES), também palestrou no fórum. Ela, que também é professora de direito trabalhista e apontou que o Direito do Trabalho é um dos ramos mais acirrados do Direito e um dos campos de maiores vitórias para a sociedade mundialmente.

A magistrada relatou que quando se discute o negociado sobre o legislado e esse campo acirrado de confluência entre o econômico e o social não se pode dispensar os efeitos da mundialização e da produção mundial de serviços e produtos. “Mas sabemos que em nosso País, apesar de termos a ciência de que o mundo mudou, o Direito do Trabalho continua avançando em sua gênese, que é a proteção do direito dos trabalhadores”, disse ela, ressaltando que só existem consumidores porque antes existem trabalhadores.

Ela lembrou que a intervenção estatal no campo do Direito do Trabalho é mínima, por mais que tenham setores da sociedade interessados em desqualificar o campo – principalmente no período histórico que o País enfrenta. “Não estamos querendo pedir que o estado nos faça ricos no sentido liberal da expressão, nós queremos o mínimo que todo o cidadão precisa para sobreviver dignamente. Por isso, o salário é mínimo, a jornada de trabalho estabelecida é a máxima possível e as férias se dão não só depois de 12 meses de trabalho, mas o gozo pode acontecer depois de 23 meses de trabalho”.

Tauceda lembrou, também, que os trabalhadores têm um salário mínimo definido em Constituição de R$ 880 para sustentar o trabalhador e sua família. “Portanto, vamos começar limpando a área. O que precisamos no Brasil é de uma reforma tributária. Nós não precisamos acabar com os direitos dos trabalhadores, não é isso que fale nenhuma empresa e a prova disso é que temos empregadores domésticos no Brasil numa quantidade que nem em países de Primeiro Mundo existe, porque se a força de trabalho fosse cara no Brasil, não teria tanta gente com empregada doméstica pagando salário mínimo. Nós podemos pagar um salário mínimo, sim. Agora, o que a gente não pode é ter uma conversão do que a gente paga ao estado tão mal aproveitado de modo que nada se reverta para nós”.

A desembargadora afirmou que o estado cria o patamar mínimo civilizatório, dizendo que tem de haver salário mínimo, férias e décimo terceiro, por exemplo. No entanto, dá poder aos sindicatos a estabelecerem novos direitos aos trabalhadores, já que as entidades conhecem a própria base. O problema do negociado versus o legislado, apontou a magistrada, surge porque o modelo sindical brasileiro tem três questões que amarram as mesas de negociação coletiva que são unicidade sindical, imposto sindical e distribuição por categoria.

Ela explicou que as mesas de negociação estão passando por uma situação tão trágica no Brasil – de tanto repetir somente o que está na CLT ou tirar direitos dos trabalhadores – que elas têm enfrentado a ira do Ministério do Trabalho e Emprego, do Ministério Público do Trabalho (MPT) e da Justiça do Trabalho porque o que era para ser o instrumento e a ferramenta de conquistas sociais tem servido apenas para tirar direitos dos trabalhadores.

Se houvesse outro modelo sindical, segundo Ana Paula Tauceda, o negociado seria a melhor saída. “Nós precisamos ter uma cultura de diálogo no nosso País, e o negociado significa o ápice da maturidade democrática, mas somente quando ambos os atores estão em patamar de igualdade, onde não existe submissão de um pelo outro. São dois atores coletivos – empresa e sindicato fortes negociando – e daí as normas seriam melhores do que o patamar mínimo civilizatório vindo do estado, porque elas significariam mais do que o estado viria a dar, mas aquilo que o sindicato queria alcançar e é isso que a sociedade brasileira precisa do sindicato”.

Ela chamou a atenção para o número excessivo de sindicatos no País – são mais de 15 mil – e para o déficit de representatividade deles. Para a desembargadora, há muitas entidades para pouca qualidade de representação.

Ana Paula Tauceda salientou que os sindicatos têm o poder de transacionar direitos, e não negociar e ninguém pode abrir mão daquilo que é patrimônio da sociedade, que são os direitos dos trabalhadores. Ela ressaltou que a sociedade quer a negociação para adequações e melhoras, não para a retirada de direitos.

A magistrada apontou que é necessária uma reforma sindical no País. “Sem a reforma sindical é impossível o negociado prevalecer sobre o legislado sem gerar uma lesão e uma verdadeira fraude ao direito dos trabalhadores”.

A representante da Fentec também palestrou no fórum e ponderou que, mesmo diante de um cenário enfraquecido, nada impede que, com as informações que são dadas, não se consiga arregimentar a unidade necessária para mudar esse cenário caótico vivenciado no momento.

As principais ameaças estão na forma como vem sendo “vendido” o negociado sobre o legislado sob a argumentação de fortalecimento da negociação coletiva e a democratização das relações de trabalho quando, no momento em que o País está em crise esse fortalecimento nas negociações representa exclusivamente a manutenção do emprego, e não do trabalho decente.

A alegação de que se não for aprovado o negociado pelo legislado o País terá maior desemprego é um desrespeito completo aos princípios constitucionais previstos na Constituição Federal, na opinião de Zilmara. “A partir do momento que tenho o trabalho como direito fundamental, que traz a dignidade da pessoa humana, abrir mão de todas as conquistas e direitos que estão no bojo da legislação e trazer para os sindicatos o ônus de negociar a mera manutenção dos postos de trabalho cada vez mais indecentes e precarizados cabe ao movimento sindical negar. O negociado sobre o legislado é uma armadilha que está sendo posta na mão daqueles que detêm o poder de negociação coletiva”.

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