Sindicalista, Herval Nogueira acredita que negativa ao seu pedido de emprego pela Ogmo é fruto de perseguição política
O trabalhador portuário e sindicalista Herval Nogueira Junior, de 59 anos, pedalou 641 km para mostrar aptidão física para o trabalho e denunciar a perseguição política que, acredita, seja o motivo da negativa que recebeu ao seu pedido de emprego. Foram quatro dias de viagem desde Barra do Riacho, litoral de Aracruz, no norte do Estado, onde reside, até a cidade do Rio de Janeiro.
A inusitada manifestação e protesto é acompanhada de um laudo médico afirmando a aptidão para o trabalho pleiteado, graças à excelente recuperação alcançada após duas cirurgias para substituição das rótulas naturais de ambos os joelhos.
“Uma pessoa que pedala 640 km em quatro dias não está apta para trabalhar? Os médicos que atendem ao Ogmo [Órgãos de Gestão de Mão de Obra do Trabalho Portuário Avulso] estão desatualizados. Primeiro agradeço a Deus e, abaixo, ao médico que me operou [Gustavo Ribeiro], que me orientou na minha recuperação física, e o que atestou minha aptidão para o trabalho [Marcos Robson Alves]”, declara.
Herval conta que deu entrada no pedido de emprego ao Ogmo em janeiro. Durante realização dos exames exigidos, a coordenadora do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) solicitou consultas com otorrinolaringologista e cardiologista, que não eram cobertas pelo Ogmo, e, após os laudos positivos de ambos, requereu também um laudo de ortopedista. Mas, nesse caso, seria com médico indicado pelo Ogmo.
“Como demorou muito pra marcar a consulta com o médico deles, eu marquei com um particular, que me deu laudo positivo. Quando finalmente consegui marcar com o do Ogmo, fiz questão de ir de bicicleta, porque já tinha um laudo positivo, não tinha porque ter um negativo depois”, conta o portuário. A viagem somou 184 km entre Barra do Riacho e Vila Velha, na região metropolitana, endereço do consultório.
“O médico me disse que eu sou um ‘ponto fora curva’ e que ficou impressionado com a minha recuperação”, relata o sindicalista, explicando que a maioria das pessoas que passa pelas cirurgias que ele faz geralmente não consegue flexionar os joelhos a ponto de conseguir pedalar sentado.
“Não passa de 45º, geralmente. Mas eu consigo, pedalo, fico de cócoras. Porque fiz o fortalecimento da musculatura da coxa e da panturrilha, como o meu médico me recomendou”, conta, ressaltando uma dica importante, que é não deixar o joelho subir mais que o quadril, quando sentado no selim.
Depois de ter tido o seu caso clínico classificado como um “ponto fora da curva”, Herval se surpreendeu com a negativa da coordenadora do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional. “Ele disse isso para mim dentro do consultório, mas não pude ler o que ele escreveu no laudo, ele fez no computador e mandou direto pra ela, eu não pude ler. Mas como é que ele fala tudo isso pra mim e a médica do Ogmo me diz que sou inapto?”, questiona.
O portuário e sindicalista se diz revoltado. “O grande problema é que eu não tenho culpa de ainda existir médico arcaico, que precisa de modernizar (reciclar) para acompanhar as novas tecnologias e não cometer erros com as evoluções ortopédicas, que proporcionam resultados magníficos no ser humano”, argumenta, quando compara as duas visões médicas distintas que testemunhou: o ortopedista que realizou suas cirurgias e lhe deu o laudo e os médicos que trabalham para o Ogmo.
“Os ortopedistas convencionais dizem que pode colocar a prótese da rótula com mais de 65 anos de idade. Mas eu, precocemente, comecei a ter perda da cartilagem, já tinha perdido os dois meniscos, então estava ‘osso no osso’, as pernas ficando arcadas. Eu não tinha condições nem de dormir direito. Então ele me recomendou a cirurgia precoce. Disse que se não eu não teria qualidade de vida, ficaria numa cama, o que poderia provocar outros problemas. Eu já tenho hipertensão e pré-disposição pra diabetes. Acreditei nele, apostei. E deu certo”, relata.
A primeira cirurgia foi feita aos 54 anos de idade e a segunda aos 56. “Em 72 horas ele pediu pra andar, para começar a reaprender a andar. E fui fazendo o que ele recomendava: hidroginástica, bicicleta. No começo, não conseguia pedalar, mas fui melhorando rápido. Comprei uma bicicleta aro 29 e logo comecei a andar quilômetros”, prossegue. Em 2019, Herval conta que pedalou 324 km até Campos dos Goytacazes, em três dias. Em 2021, foram 222 km um dia só, ida e volta. E agora em 2022, os 640 km em quatro dias.
“Em pleno século XXI, um médico dizer que o ser humano não era para andar ereto e sim de quatro patas, pois aí não teria problema de coluna?”, indigna-se, citando uma ironia repetida entre os colegas portuários a partir de uma fala atribuída a um médico com vasto histórico de prestação de serviços à Portocel e ao Ogmo.
Sobre o viés político, é incisivo. “Fui militante sindical por 19 anos e retornei no ano passado à diretoria do Sindicato Unificado da Orla Portuária do Espírito Santo [Suport-ES]. Tenho uma história de luta por direitos dos portuários e defesa do porto do Espírito Santo. E continuo na luta contra a privatização. Junto com outros companheiros, temos denunciado o absurdo do edital de privatização da Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa), que vai colocar em risco o movimento no porto, ameaçar a estabilidade dos concursados, o futuro dos aposentados e prejudicar toda a sociedade”, afirma.
Herval tem 35 anos de carreira nos portos capixabas, boa parte deles participando da direção Suport-ES.