O Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) protocolou um recurso ordinário contra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-ES), que julgou improcedente uma ação de investigação judicial eleitoral contra o governador Paulo Hartung (PMDB) por supostos ilícitos cometidos no pleito de 2014. A propósito, ficou a impressão de que o TRE fez de tudo para o partido perder o prazo. O PSOL foi notificado na quinta-feira (18), que tinha três dias para apresentar o recurso, ou seja, a própria quinta, a sexta, sábado, como domingo não conta como dia útil, o advogado do PSOL, André Moreira, teve que correr para não perder o prazo, que se encerrava na segunda-feira (22).
O recurso foi encaminhado ao presidente do TRE-ES, desembargador Álvaro Bourguignon, que deverá decidir sobre a remessa ou não dos autos para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília. Como o Bourguignon não pode mais analisar o mérito do recurso, ele só poderia barrá-lo por interpretação adminitrativa, referente ao prazo, que foi cumprido pelo PSOL, ou no enquadramento técnico do recurso. O partido apresentou um recurso ordinário, haveria, em tese, a possibilidade de o desembargador ter entendimento diverso, alegando que o recurso deveria ser especial, o que poderia invalidá-lo. Do contrário, se tudo ocorrer dentro da normalidade, o caminho é a remessa do recurso para o TSE.
O Código Eleitoral prevê que, caso admita o recurso, as partes deverão ser notificadas para que apresentem suas justificantes antes da remessa dos autos à instância superior. Caso o recurso seja rejeitado, o PSOL poderá entrar com um agravo de instrumento para garantir a possibilidade de o caso ser rediscutido pelos ministros do TSE. Existe ainda a possibilidade de o processo ser levado ao Supremo Tribunal Federal (STF), em caso da existência de divergência sobre o reexame ou não da questão pela corte máxima da Justiça Eleitoral.
No recurso, o partido pede a reconsideração da decisão do TRE-ES que, de forma unânime, em julgamento realizado no último dia 10, rejeitou a ação proposta por integrantes da sigla sobre a suspeita de abuso do poder político e econômico por parte de Hartung no pleito do ano passado. O PSOL acusa o governador eleito de ter omitido patrimônio em sua declaração de bens à Justiça Eleitoral, além da existência de indícios da suposta prática de “caixa dois” por meio da empresa de consultoria Éconos, antiga sociedade entre o peemedebista e o seu ex-secretário da Fazenda, José Teófilo de Oliveira.
Durante o julgamento, o relator do processo, desembargador Sérgio Luiz Teixeira Gama, que também é corregedor do TRE-ES, chegou a admitir que seria “recomendável” ao peemedebista ter declarado a íntegra de seus bens, mas o episódio acabou sendo classificado como “mera irregularidade formal” que não teria o potencial de influenciar na disputa eleitoral ou provocar a cassação do mandato de Hartung. Em relação às demais acusações, Sérgio Gama alegou que não existiriam provas dos supostos ilícitos – apesar do mesmo ter rejeitado o pedido de produção de provas feita pelo PSOL, que pediu a quebra do sigilo fiscal da Éconos e ESSE TRECHO DO TEXTO FOI EXCLUÍDO POR DECISÃO JUDICIAL
Foi citado ainda no julgamento que a denúncia do PSOL se baseou em reportagens publicadas pelo jornal Século Diário, que não apresentariam, no entendimento do togado, “qualquer substrato probatório”. O revisor do processo, juiz eleitoral Danilo de Araújo Carneiro, seguiu o entendimento do relator. Em seu voto, voltou a classificar as acusações como genéricas e avaliou que a quebra dos sigilos deveria ocorrer somente após o recolhimento de mais indícios dos supostos crimes eleitorais. O posicionamento foi seguido pelos demais integrantes do TRE-ES, além de ter sido externado pelo representante do Ministério Público Eleitoral (MPE).
Caso o recurso seja aceito pela corte estadual e o TSE decida eventualmente pela reabertura das investigações, esse seria o segundo caso de investigação sobre os mesmos fatos em Brasília. O governador capixaba responde a um inquérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ), já que o peemedebista tem foro privilegiado em função do cargo. Durante a votação, o procurador regional eleitoral, Carlos Vinícius Soares Cabeleira, destacou que a omissão de bens está sendo apurada em sede criminal. No caso da ação de investigação proposta pelo PSOL, o caso seria de natureza cível.
Na denúncia, os integrantes do partido acusam o governador eleito de omissão na declaração de bens, como nos episódios da “mansão secreta” em um condomínio de luxo em Pedra Azul, no município de Domingos Martins (região serrana do Estado) e da empresa familiar. Sobre as suspeitas de caixa dois, o PSOL citou a revelação da lista de clientes da Éconos, que faturou R$ 5,8 milhões em pouco mais de três anos de atuação. Desse total, R$ 4,3 milhões foram faturados durante o período em que Hartung figurava como sócio da consultoria: entre maio de 2011 e julho de 2013.
A lista de clientes de Hartung e José Teófilo incluía empresas com projetos no Estado, como a TPK Logística, pelo projeto do Porto Central, e a Manabi Logística, além de empresas fundapianas (Cisa Trading e Tristão Companhia de Comércio Exterior), empreiteiras (A Madeira Indústria e Comércio, que atuou nas obras do posto fantasma em Mimoso do Sul) e concessionárias de serviços públicos, como a Rodosol e a EDP Escelsa. Nesta última, o governador foi nomeado como conselheiro de administração do grupo EDP – controlador da Escelsa – logo após deixar o segundo mandato no Palácio Anchieta, em 2011. Hartung pediu renúncia do cargo em 2013, já com vistas a participação no processo eleitoral no ano seguinte.