sexta-feira, novembro 22, 2024
23.9 C
Vitória
sexta-feira, novembro 22, 2024
sexta-feira, novembro 22, 2024

Leia Também:

A energia limpa e o Espírito Santo

Carlos Henrique Veloso de Carvalho*
 
Um importante dilema se apresenta para o Espírito Santo: como incentivar as energias limpas sem perder receita do imposto sobre a energia? Nesses tempos em que o Estado precisa tanto equilibrar suas contas e a receita de royalties do petróleo está em queda, é quase um pesadelo prescindir também das receitas dos impostos sobre a energia elétrica. Como resolver esse intrincado dilema?
 
A origem do problema
Tudo começou com a Resolução 482/2012 da ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica, que criou e definiu normas para o Sistema de Compensação de Energia, permitindo que qualquer pessoa ou empresa instale sistemas de geração própria de energia conectados à rede SIN – Sistema Interligado Nacional, responsável por 98,3% de toda a energia do país.
 
Apesar da resolução da ANEEL não definir qual a fonte de energia, na prática ela deu origem a um imenso mercado nacional de Energia Solar Fotovoltaica, por ter maior disponibilidade e também por preços mais acessíveis e facilidade de financiamento.
 
Esse é o problema: se qualquer pessoa ou empresa agora já pode instalar uma pequena usina solar, como o governo poderá suportar a perda de arrecadação de impostos sobre a energia quando a maioria estiver gerando a própria energia que consome, como já acontece em diversos outros países como Alemanha, Itália, Portugal, Estados Unidos, etc?
 
A perda de receitas de impostos sobre a energia
 
Para melhor entender a questão, vamos imaginar duas situações extremas. Uma empresa instala sistema de energia solar e usa toda a energia gerada durante o dia, quando suas máquinas estão ligadas. Neste caso a empresa não pagará pela energia consumida nem tampouco terá de pagar imposto, pois a energia é consumida no mesmo momento em que é gerada (será cobrada apenas a taxa mínima ou, se for grande empresa, apenas a demanda contratada).Mesmo sem dar qualquer incentivo, o governo já perderá hoje toda a arrecadação de ICMS desse consumidor.
 
Outra situação bem diferente é a residência que também tem sistema solar, mas seu consumo de energia acontece somente à noite, quando a família se encontra em casa. Nesse caso a energia gerada durante o dia pelo sol não é utilizada na hora, mas é injetada na rede, gerando créditos que poderão ser consumidos à noite. Acontece então um absurdo, pois o consumidor é obrigado a pagar o imposto, mesmo que não tenha de pagar pela energia propriamente dita.
 
O governo federal, através da Resolução 016/2015 do Confaz – Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), corrigiu rapidamente essa distorção e isentou os impostos federais como PIS/PASEP e COFINS sobre os créditos de energia. No entanto, como a isenção do ICMS é decisão de cada estado, nem todos aderiram a essa resolução. Os poucos estados que ainda não aderiram representam menos de 25% da população brasileira e o ES é o único da Região Sudeste que ainda não aderiu.
 
Como iluminar o Espírito Santo
 
Não adianta o governo do Espírito Santo insistir em cobrar impostos sobre a energia que é apenas “emprestada”, pois não se pode tributar uma transação onde não existe pagamento em unidades de moeda, apenas créditos em unidades de energia.Os futuros governos provavelmente receberão essa “herança maldita” de inúmeros processos judiciais dos que estão sendo agora indevidamente tributados por consumir a própria energia que geraram.
 
É importante reconhecer que a adesão à Resolução 016/2015 do Confaz é uma questão muito mais psicológica do que um problema real para os cofres do governo do Espírito Santo, que já está perdendo a maior parte da receita de impostos sobre a energia de qualquer jeito, pois essa energia em excesso, que é emprestada para a rede e depois volta em forma de créditos, representa apenas uma pequena parcela da perda total de impostos, já que a maior parte da energia é gerada e consumida no mesmo momento, restando apenas poucos créditos para serem (indevidamente) tributados.
 
Ou seja: se aderisse à Resolução do Confaz o governo perderia quase nada em curto prazo e pouco em longo prazo. Apesar disso, parece que governo insiste com essa cobrança absurda provavelmente por não entender corretamente esse dilema e ao mesmo tempo não enxergar as diversas oportunidades que está perdendo para outros estados.
 
Por que só enxergar um problema onde existem diversas soluções?
 
Precisamos investir e incentivar a geração distribuída, principalmente porque:
1. Promove o desenvolvimento e a inclusão das regiões mais pobres do Estado.
2. É grande geradora de empregos. O órgão das Nações Unidas, IRENA (International Renewable Energy Agency), publicou recentemente um relatório que mostra o grande número de empregos gerados em regiões que tiveram adoção de energia distribuída. O baixo índice de desemprego nos Estados Unidos, inclusive, pode ser explicado em boa parte pelo grande volume de sistemas distribuídos que estão sendo instalados. O melhor é que a mão de obra é normalmente recrutada e qualificada na mesma região em que é instalado o sistema.
3. Independência da importação de energia de outros estados, o que fará com que fique por aqui o capital que é hoje exportado para compra da energia de outros estados.
4. Maior segurança energética e menos dependência de hidrelétricas e térmicas, o que é importante principalmente durante os períodos de falta de chuva.
 
Isso sem falar em outros benefícios importantes, como a diminuição do aquecimento global com menos Gases de Efeito Estufa, menor pressão por fontes não renováveis e poluidoras, menos perdas e falhas na transmissão e distribuição (já que o consumo de energia ocorre próximo ao lugar da geração).
 
Ou seja, são tantas as vantagens, que chega a ser incompreensível a inércia do governo de nosso Estado ao não tomar atitude para incentivar as energias limpas.
 
Onde estão os projetos de Energia Limpa para o ES? Quais são nossas metas?
 
Além de incentivar a geração distribuída, o governo deveria também procurar trazer para o ES grandes usinas de energia limpa (principalmente fotovoltaica e eólica). Essa seria, inclusive, uma boa forma de preservar o faturamento de impostos. É preocupante não ver projeto algum em nosso Estado enquanto tantos estão sendo colocados em prática em outros estados, com as maiores usinas da América Latina na Bahia (usina fotovoltaica de 254 MW na cidade de Tabocas do Brejo Velho), Piauí (usina de 292 MW em Nova Olinda), Minas Gerais (usina de 240 MW em Pirapora), além de diversas outras.
 
Onde estão os projetos para o nosso ES? Será que está sendo feito pelo menos algum “estudo”, ou nosso governo continuará não enxergando o SOL como uma oportunidade? Por que nosso governo não apresenta sequer um plano de metas para energias limpas? É triste perceber que o governo do Espírito Santo não considera esse setor da economia importante e estratégico e não apresenta qualquer alternativa.
 
Leia também
 

*Carlos Henrique Veloso de Carvalho é engenheiro eletricista da empresa SolarGrid e membro do Grupo Pró Energia Solar ES

Mais Lidas