Em Guarapari, a Justiça estadual considerou inconstitucional uma lei municipal que acabava com licitação para concessão de permissão de táxi e instituía a outorga por ato discricionário. Mais especificamente, a decisão anulou leis complementares aprovadas em 2014 que alteraram artigos da lei municipal que regulamenta o serviço, de 2012, que substituíram a permissão do serviço por autorização. A decisão é do juiz Gustavo Marçal da Silva e Silva.
A lei tinha o mesmo teor do projeto apresentado em 2013 pelo presidente da CPI dos Táxis da Câmara de Vitória Devanir Ferreira (PRB), que acabou arquivado. A proposta, alterando dispositivos da lei municipal de regulamentação do serviço de táxi, também substituía a permissão por autorização. Na prática, o projeto azeitaria o esquema de formação de frotas particulares de táxi em Vitória.
Termos como “autorização” e “autorizatário”, em substituição à permissão e permissionário, foram utilizados pelo presidente do Sindicato Profissional dos Motoristas de Táxi (Sindtavi), João Valiati Fidêncio, em depoimento à CPI em maio.
Ironicamente, a decisão judicial se volta contra a autora da ação, a Associação dos Taxistas e Defensores do Centro de Guarapari. A entidade pleiteou liminar para cancelamento ou suspensão do processo licitatório publicado em 2014 ou, alternativamente, a manutenção dos taxistas atuais na concessão sem exigência de licitação.
Entre outros pontos, a entidade sustentou que é inviável a concessão de permissão por licitação por existir regulamentação própria da profissão por lei federal e municipal que assegurariam a prestação do serviço por autorização, inclusive com direito sucessório. Argumentou também que muitos taxistas substituídos são profissionais com anos de profissão, que seriam prejudicados com uma licitação.
Os pedidos, no entanto, foram julgados improcedentes. A decisão aponta a “plena legitimidade do Edital de Licitação questionado na presente demanda, voltado à concessão/permissão dos serviços de táxi no âmbito da municipalidade ré, como instrumento moralizador e garantidor da impessoalidade na Administração Pública, que não comporta mais feição patrimonialista, favorecimentos e perseguições no exercício de suas funções”.
Em seguida, a decisão condena a outorga por autorização. “Com efeito, da leitura dos citados dispositivos, verifica-se que houve, efetivamente, a tentativa de classificar o serviço de táxi como sujeito ao regime de autorização, o que fere, indubitavelmente, princípios constitucionais da Administração Pública, especialmente os inerentes ao processo licitatório”.
Para o juiz, a ausência de licitação “diminui o controle e a fiscalização da municipalidade, ensejando o esbulho do trabalho humano, bem como a má qualidade do serviço prestado”.
A alteração do artigo 9° da lei, que originalmente determinava prazo de 10 anos para as permissões, instituindo a transmissão sucessória do direito à exploração do serviço em caso de falecimento do outorgado, é vista como descabida, imoral e inconstitucional.
“A inconstitucionalidade, portanto, da previsão legal autorizando a transferência da permissão, via direito sucessório, a sucessores do permissionário, reside na flagrante violação ao principio constitucional da impessoalidade, eis que direciona a pessoas específicas o direito subjetivo de exigir da administração a transferência da permissão para si, em detrimento de diversos outros cidadãos que teriam também o interesse em prestar o serviço de táxi”, escreve o togado.