É com uma câmera digital de modelo pequeno e discreto que Syã Fonseca (foto acima) sai na rua em busca de cenas, de acontecimentos da cidade, de movimento cultural e agitação popular. O fotógrafo de apenas 25 anos procura por experimentações enquanto tenta retratar cenas urbanas da forma mais natural possível, sem interferir enquanto fotógrafo. É até por isso que Syã usa uma câmera discreta também – além de ser ele mesmo ser discreto, se misturando na cidade em busca de não ser percebido no cotidiano das pessoas em ruas, praças, prédios e escadarias.
Com esse perfil, muitos dizem que o jovem é um fotógrafo de rua, daqueles que rodam mundos retratando de formas particulares e poéticas as cidades e seus habitantes. Syã se mostra um fotógrafo realmente aberto a outras experiencias fotográficas e propostas, se desfazendo aos poucos de conceitos e conhecendo outros. Foi assim o com Preto e Branco (p/b) da fotografia dele. Durante muito tempo tirou fotos em que a arquitetura da cidade, lambida pelos contrates do sol, davam origem a belíssimas fotografias em p/b. Atualmente ele quer aventurar-se nas cores. Foi assim também com a câmera analógica e a transição recente para a máquina digital.
“Peguei essa coisa do Preto e Branco com o Rogério Medeiros (fotógrafo e jornalista), já que quando comecei a trabalhar organizando os arquivos dele, tinha acesso a muitas fotos, a maioria delas em p/b – foi o que eu tive como referência inicial”, recorda ele, que começou desde muito cedo a envolver-se com imagem e câmeras – mas isso será assunto para depois, por enquanto Syã dá ênfasê a lembrar como é trabalhar com o colorido ou o p/b.
“O negócio do p/b é uma brincadeira de cores. Não é que consigo captar melhor nesse conceito, é o que eu dei preferência por muito tempo. O p/b é um jogo de luz e sombras. Já quando você envolve a cor, tem mais elementos em cena. Digamos que em p/b você olha uma fotografia não pela cor que tem dentro dela, mas pela forma. Quando você envolve a cor, precisa equilibrar, fazer uma foto pensando nisso. Um fotógrafo colorista vai atrás da cor, não só da forma. E eu gosto muito da forma”, detalhou Syã.
E assim, como faz pouco tempo que Syã tem fotografado com a máquina analógica, também faz pouco tempo que ele voltou para Vitória. De 2010 até 2014, o jovem morou em São Paulo, trabalhando na maioria do tempo com pintura decorativa e de restauro. Isso aconteceu após já ter vivido a primeira experiência com o universo fotográfico e audiovisual com o pai, o artista Tião Fonseca. Em Vitória, Syã conta que realiza alguns freelas, tem tempo para fotografar, e é quem ilustra com fotos o blog Flânerie, de Manuela Neves, que tem como motivo de existência o Centro de Vitória e suas histórias, a cidade e a relação do homem – o que se encaixa perfeitamente nas propostas do fotógrafo.
Em Vitória, Syã circula e mora. Sai para todos os lugares que frequenta com a câmera dentro da mochila. Tudo de forma simples: sair e fotografar. “Para tocar o meu projeto não dependo de nada. Então sempre tem foto nova”, destaca ele, que acrescenta o que considera de parecido e diferente entre as saídas fotográficas em São Paulo e Vitória. “O que percebi de interessante sobre a rua de São Paulo e a rua de Vitória é que lá existem milhões de coisas em quantidade para fotografar. Aqui também tem, mas principalmente aos olhos de quem está só de passagem. O difícil é quando chega o momento em que isso se esgota muito rápido. E para mim, Vitória tem se esgotado muito rápido. Não é tão legal andar na rua hoje, como eu andava quando cheguei aqui. Fico sempre procurando algo novo, às vezes rolam eventos no Centro, como ensaios de bandas de Congo”, comenta, afirmando que precisa adentrar mais nos locais de Vitória que ainda não frequenta. “Na verdade o que está esgotado é o meu círculo. O que me limita sou eu. Preciso sair mais para cobrir a movimentação”, acrescenta.
E é exatamente a movimentação na cidade que Syã procura. A agitação urbana e o homem em meio a isso. Em suas fotos é possível perceber que quase sempre estão presentes os elementos gente e a arquitetura, que ele diz gostar muito. A união disso resulta em retratar pessoas em suas paisagens urbanas. Em retratos que querem mostrar a naturalidade de ações. “Na rua o que importa é muito o elemento surpresa. É chegar no momento da cena e fotografar antes da pessoa perceber que está sendo fotografada. Isso faz a pessoa não se colocar uma máscara. Depois que ela percebe, acabou o jogo”, explica.
Uma pausa na fotografia
O ofício de fotógrafo não foi algo que nasceu com Syã ou um trabalho escolhido para a vida toda. Ainda muito jovem, ele aventurou-se com o pai na gravação de matérias sobre manifestações folclóricas. Foi nesse período, em que ajudava como assistente de câmera, que o garoto teve os primeiros contatos com imagem, movimentos de câmera e conceitos. “Esse período foi muito bom porque eu fiquei meio assustado com esse trabalho, já que meu pai era bem rígido – acho até que por isso escolhi fotografia, para poder trabalhar de forma mais individual. Devo muito ao pai por me colocar nisso, mas devo muito aos 'sofrimentos' daquele ofício, que me ajudaram a descobrir outra coisa dentro do ramo”, fala Syã.
Depois disso, ele estagiou nos arquivos já citados de Rogério Medeiros e, ao fim do estágio, sem saber o que fazer, aceitou uma proposta de emprego em São Paulo, de pintor – ofício pelo qual trabalhou certo tempo, sem resgatar em nenhum momento a fotografia, até acontecer algo, que ele mesmo conta. “Certo dia estava andando numa rua em São Paulo e avistei uma banca de livros. Lá encontrei aquele livro do Bresson, O olhar do Século. Aquilo me fez lembrar de tudo o que era a fotografia para mim, recordei da câmera analógica deixada no conserto por meses e meses, e pensei em ir lá buscá-la. Foi um momento em que voltei a querer trazer a fotografia novamente para a minha vida. Então iniciei esse processo de reaproximação. Mas até então, como eu não tinha muita intimidade com a fotografia, fiquei sem saber o que fazer com a câmera em São Paulo. Havia já comprado uns filmes, mas ficava parado por não ter muito o que fotografar. Foi quando me surgiu a ideia de ir para a rua e usar a cidade”.
Nas ruas de São Paulo Syã fotografou paisagens urbanas, pessoas, movimentos populares e uniu-se ao coletivo SelvaSp, em que fotografou as manifestações populares de 2014, teve fotos circulando por diversos sites nacionais a até internacionais e, assim, pode aprimorar e amadurecer a fotografia. Com o tempo, largou o trabalho de pintor e seguiu com freelas como fotógrafo, até decidir voltar para Vitória. Por aqui gosta de ir atrás de manifestações populares, como os ensaios das bandas de Congo, a Folia de Reis em Muqui e tantas outras manifestações culturais de Ticumbi no norte do Estado. Ele acrescenta ainda que fotografar nas ruas de São Paulo é não ser percebido, já que as pessoas andam com muito pressa. Já em Vitória é o contrário, as pessoas percebem muito mais rápido, “inclusive aqueles homens da mesa da frente já olharam para nós muito intrigados – falo isso pelo fato de gostar de observar, de ter essa 'mania'”, comenta ele.
Na capital do Estado, Syã já teve a oportunidade de criar uma espécie de coletivo com os mesmos objetivos do SelvaSP: dar vazão para a fotografia de rua. Contudo, o projeto, intitulado Street Photo Ilha, diferencia-se por não ser formado unicamente por fotógrafos, qualquer pessoa pode enviar uma foto de Vitória, ou do Espírito Santo, para a página oficial do coletivo na internet e, assim, ter a foto publicada por lá. Além disso, Syã comenta que tem muitos projetos na cabeça, mas ainda recai sobre o fato de como poder colocá-los em prática, como financiamento. E numa breve volta no Centro de Vitória, ele dá uma pausa para fotografar rapidamente algo que lhe chamou atenção na Praça Jerônimo Monteiro – claro, na sutileza de não ser percebido pelas pessoas que circulam sem muita pressa pelo local.