Acorda, CPI do Pó Preto: as maiores poluidoras do ar do Espírito Santo são a Vale, ArcelorMittal, Samarco e Aracruz Celulose (Fibria). Todos sabem, todos veem os poluentes saindo das chaminés. Entretanto, nesta segunda-feira (13), o presidente da comissão, deputado Rafael Favatto (PEN), retomou o discurso da importância de outras fontes poluentes, como a re-suspensão das vias, a construção civil e os carros como contribuintes relevantes da poluição do ar.
O discurso, repetido à exaustão, sinaliza que o relatório da CPI indique um mundo de fontes poluidoras, mascarando o papel das verdadeiras poluidoras do ar no Espírito Santo. As pelotizadoras e as siderúrgicas, na Grande Vitória e no sul do Estado, e a Aracruz Celulose (Fibria), no litoral norte, são as principais fontes de poluição do ar. A Fibria tem três usinas de grande porte.
A CPI do Pó Preto da Assembleia Legislativa recebeu nesta segunda-feira os secretários municipais Jader Mutzig, de Desenvolvimento Sustentável de Vila Velha, Cláudio Denicoli dos Santos, de Desenvolvimento da Cidade e Meio Ambiente de Cariacica, Max da Mata, de Meio Ambiente de Vitória, e Andréia Pereira Carvalho, de Meio Ambiente da Serra.
Depois de o deputado Favatto dar ênfase à poluição produzida pelos veículos, por re-suspensão de vias, pela construção civil e sinalizar que estas fontes serão consideradas importes no relatório da CPI, dois dos secretários municipais deram contribuições para mostrar o erro do presidente da CPI, que tem sua visão compartilhada pelo relator Dary Pagung (PRP).
O secretário de Cariacica foi incisivo ao dizer que sem as duas grandes poluidoras do ar na Grande Vitória, Vale e ArcelorMittal, a região não teria pó preto. O pó seria acinzentado. E ilustrou: São Paulo, a capital, não tem pó preto. Sua poluição é de outra natureza. Cobrou que a CPI foque as mineradoras ao apontar o que deve ser feito em seu relatório.
Já o secretario de Vila Velha lembrou que Brasília tem uma frota maior do que o Espírito Santo e o Distrito Federal o terço da área do Espírito Santo. Tem poluição, uma poeira alaranjada, da cor da terra da região. Mas não tem pó preto.
Favatto citou o relatório que aponta a re-suspensão como relevantes. Mas se trata de um estudo feito por encomenda. Entrou a re-suspensão da poeira das vias, e baixo o volume de poluição da Vale e da ArcelorMittal. Um estudo feito pela Ecosoft, que vende serviços tanto para o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema), órgão fiscalizador, como para as poluidoras Vale e ArcelorMittal Tubarão e Cariacica e, também para a Samarco, empresa da Vale.
É preciso destacar que a CPI do Pó Preto é considerada chapa branca, montada para blindar o governador Paulo Hartung (PMDB) de críticas. O governador é responsável por licenciar a 8ª usina da Vale, completando a quantidade de poluição que inferniza a vida dos moradores da Grande Vitória, produzindo doenças e mortes.
O secretário Jader Mutzig também fez, pelo menos em parte, uma antiga uma cobrança dos ambientalistas: a de que as informações do sistema de controle de qualidade do ar sejam disponibilizadas em tempo real. Na realidade, os ambientalistas cobram que os controles das emissões sejam feitos nas chaminés das fábricas pelo próprio Estado, com pessoal efetivo e capacitado. Com informações disponibilizadas na internet, em tempo real.
No conjunto, os secretários apontam a deficiência dos órgãos fiscalizadores – leia-se: Iema -, apontando não só carência de pessoal, como de meios materiais. A secretaria da Serra citou além do Iema, o Ibama.
Há quem cite um certo “cone de poluição”, como acredita existir o secretário de Vitória. Ocorre que a poluição do ar afeta cada centímetro da Grande Vitória e todos os seus moradores. Não há cone, mas toda uma região afetada. Cariacica e Vila Velha, em particular, pela ArcelorMittal Cariacica, localizada na divisa dos dois municípios.
Há um mundo de fontes de emissão de poluentes nas pelotizadoras, oito usinas da Vale no Planalto de Carapina, e nas siderúrgicas, quatro, da ArcelorMittal, das quais três no Planalto de Carapina, e uma em Cariacica. A Vale tem 400 pontos de emissão de poluentes, e a ArcelorMittal 300.
Entre as fontes de poluição mais prejudiciais, as pilhas de minério e carvão, de onde saem o material particulado, arrastado pelo vento. Mas as chaminés são imbatíveis nos danos à saúde dos moradores e ao ambiente ao emitir poluentes gasosos, entre eles os derivados do enxofre e do nitrogênio, sem nenhum tratamento. As chaminés das empresas têm equipamentos velhos, obsoletos.
Os municípios são omissos no combate direto à poluição do ar, tanto na Grande Vitoria, como nas outras regiões. A atuação dos municípios na área ambiental é feita às vezes em parceria com as poluidoras. São pequenos projetos que as empresas financiam, aqui e ali. Em Vila Velha, a Vale é parceira na recuperação da restinga, informou o secretário. Na Serra, a ArcelorMittal apoia projeto de reaproveitamento de óleo, assinalou sua secretária.
Poluição do mar
O episódio da poluição do mar também foi tema da discussão da CPI. A Vale polui há décadas o mar em Camburi. Mas o último flagrante, feito por um canoísta, e confirmado por vereadores e pela prefeitura, obrigou a prefeitura e até o Iema a anunciar que multariam a empresa. Os valores ainda não foram fixados. E, quando a empresa for cobrada, ela pode ter benefício de redução da multa, ou até sua anulação, nos conselhos de meio ambiente.
Na CPI, o deputado Gilsinho Lopes (PR) cobrou mais: que os municípios, ao constatarem estes crimes ambientais, comuniquem não só ao Iema, como disse ter feito a prefeitura de Vitória, mas também à Delegacia de Polícia da área de Meio Ambiente (estadual e federal), como à Polícia Militar Ambiental, e aos Ministérios Públicos (Estadual e Federal) para que as empresas passem a ser responsabilizadas criminalmente.
O deputado Gilsinho Lopes, crítico da relação promíscua entre da Ecosoft com o Iema, Vale, ArcelorMital e Samarco, afirmou que o Iema não se deu ao trabalho de verificar a denúncia de poluição do mar pela Vale simplesmente porque este serviço seria feito por esta empresa.
O deputado ainda lembrou, em outro trecho de sua manifestação, que nem o Ministério Público Estadual (MPES) tomou providências no caso do absurdo do licenciamento da 8ª usina da Vale. Quando a vontade da população foi desrespeitada.
A manobra para rejeitar a exigência da comunidade em negar a licença de mais uma pelotizadora foi feita no segundo mandato do governador Paulo Hartung. A farsa foi comandada por Sueli Tonini, então presidente do Iema. No seu terceiro mandato, que começou este ano, Paulo Hartung a reconduziu ao cargo.
Audiência pública
Os moradores da Serra poderão protestar contra a poluição do ar causada pela Vale eArcelorMittal, em audiência pública nesta terça-feira (14), às 19 horas. A audiência será no Centro Comunitário do bairro Novo Horizonte, na rua Maritaca, 14.
Em relação ao município de Cariacica, a CPI do Pó Preto nada divulgou sobre audiência pública. Os moradores de Cariacica, da região da Grande Bela Aurora, Jardim América e outros bairros próximos, além dos moradores de Vila Velha, desde a Grande Cobilândia até aos bairros de São Torquato e Paul, são diretamente contaminados com os poluentes da ArcelorMittal Cariacica.
Estas regiões têm altos índices de doenças alérgicas, respiratórias, câncer, entre outras que a poluição do ar produz. Os poluentes lançados no ar na Grande Vitória produzem alta mortalidade.
A Vale e a ArcelorMittal Tubarão e Cariacica são as principais poluidoras da Grande Vitória. As empresas lançam 38 mil toneladas de poluentes, todo mês, sobre a Grande Vitória. Os poluentes são suficientes para encher 593 carretas, com capacidade para transportar 27 toneladas, cada.
As poluidoras lançam sobre os moradores e o ambiente da Grande Vitória poluentes como Material Particulado Total (PTS); Material Particulado (MP10) – menores que dez micra – que são inaláveis; Material Particulado PM 2.5 – que são respiráveis -; Dióxido de Enxofre (SO2); Óxidos de Nitrogênio (NOx); Monóxido de Carbono (CO); e Compostos Orgânicos Voláteis (COVs).