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‘Chega de paliativos’, diz conselheiro do Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas

“Governador, vamos convocar a primeira reunião do Fórum no seu gabinete pra que a gente possa iniciar de imediato o debate sobre as políticas públicas de adaptação do Espírito Santo às mudanças climáticas!”. 

O pedido que ecoa neste Século Diário tem sido feito ao governador Renato Casagrande (PSB) pelo ambientalista José Marques Porto, representante da ONG Associação Nacional dos Amigos do Meio Ambiente (Anama) no Conselho Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Consema) e no Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas (FCMC). 

Foto: Leonardo Sá

“Chega de paliativos! Vamos reconstruir Iconha do mesmo jeito, com casas em cima dos rios?”, questiona o conselheiro, enfatizando a necessidade de demolir construções irregulares, reassentar os moradores de áreas de risco, construir estações de bombeamento, trocar tubulações das galerias para água de chuva dos municípios, como feito recentemente nos Estados Unidos e na França, onde as tubulações de hoje são de 300mm a 500mm, bem maiores e mais seguras que as que predominam nos municípios capixabas, compara José Porto, em torno de 50mm ou 100mm. 

“Em Paris, a Champs-Elysées estava alagando com efeitos da subida do mar em relação ao rio Sena, então foram feitas as obras. Aqui a gente pode perder vidas, perder tudo e as cidades vão continuar como estão. As pessoas constroem as casas com a parte de trás, onde estão os banheiros, voltados para os rios!”, aponta o conselheiro.

“Esse uso e ocupação do solo como foi feito nos últimos 500 anos é insustentável. Eucalipto em topo de morro, cafezal sem curva de nível, pasto degradado … não dá mais!”, aponta o ambientalista. “Não tem conversa fiada. Precisa recuperar os ecossistemas, recuperar os manguezais, reflorestar com espécies nativas, acabar com as monoculturas, produzir alimentos em Sistemas Agroflorestais [SAFs], através da agricultura familiar”, assevera. 

Ainda só no papel

O Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas (FCMC) foi criado em 2006, tendo sido reformulado em 2008 pelo Decreto nº 2059-R e, em 2015, pelo Decreto nº 3812-R/2015. Em 2009, relata José Porto, foi aprovada a Política Estadual de Mudanças Climáticas, que ainda precisa de regulamentação. Por falta de atividade e renovação dos membros, o Fórum foi desativado, situação que foi revertida no primeiro ano desse segundo mandato de Casagrande. 

Em setembro de 2019, Casagrande assinou o decreto de instituiu o Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas Globais, em evento no Palácio Anchieta com palestra do cientista Carlos Nobre, do Fórum Brasileiro de Mudanças no Clima, e do diretor-executivo do think tank Centro Brasil no Clima (CBC), Alfredo Sirkis. 

Desde a publicação do decreto de criação, no entanto, o Fórum ainda não tomou posse nem realizou sua primeira reunião. “O que eu quero é que o governador marque a primeira reunião do Fórum no gabinete dele. Quanto mais tarde iniciar o debate, mais tarde vamos conseguir definir as políticas públicas. São debates urgentes, inadiáveis, que o governador continua adiando”, critica o ambientalista, ressaltando o anúncio de apoio do Estado à intenção da Suzano Papel e Celulose de expandir para o sul o deserto verde que já devasta o norte e o noroeste capixaba. “Só a Suzano consome mais do que toda a nossa população, de quatro milhões de pessoas. E ainda tem o consumo da Vale, da CST, da Petrobras, da Samarco”, contextualiza. 

“Mais da metade do Estado está na área de influência da Sudene [Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste], chove menos de 1200 mm por ano. O sul do Estado e a região centro-serrana também estão ficando assim”, alerta. “Eucalipto em topo de morro não segura água. Em Alfredo Chaves, onde tinha Mata Atlântica exuberante há vinte, trinta anos, hoje está coberto de eucalipto. Isso, na minha opinião, está na raiz do problema. A Mata Atlântica é uma floresta com raízes e outros elementos que fazem com que a água penetre no subsolo”, explica. 

Precisamos reter a chuva no solo e alimentar os lençóis freáticos, enfatiza Porto. Após as chuvas torrenciais desse final de janeiro, se seguirão meses de baixa pluviosidade. “Teremos mais um ano seco e com agravante de temperaturas cada vez mais altas. E isso sem El Niño e La Niña, pois a situação no Pacifico é de neutralidade, segundo o CPTEC [Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE)]”, informa. As chuvas, diz Porto, foram um pouco acima da média em novembro, abaixo da média em dezembro, acima da média em janeiro. Fevereiro vai ser muito seco e março e abril também serão abaixo da média. 

Foto: Secom

“Os eventos climáticos continuarão a ser cada vez mais intensos e frequentes. Vivemos uma emergência climática. Se não nos adaptarmos, o que vai acontecer sempre é morte e prejuízo, morte e prejuízo, morte e prejuízo. Não cabem mais ações paliativas, com cartão, empréstimo a juro baixo pra quem tá falido – são soluções que não são soluções. A gente tem que voltar a fazer o velho e bom planejamento. Não tem dinheiro pra tudo? Faz uma parte agora e o próximo gestor faz mais um pedaço. São obras de longo prazo”, convoca. 

Obras e ações que podem movimentar a economia de forma realmente sustentável. Se já se sabe do poder de geração de emprego e renda das obras de engenharia tão primordiais para a adaptação das cidades às mudanças climáticas, já passou da hora de enxergar o potencial econômico da restauração ambiental. 

São cerca de 200 empregos diretos para cada mil hectares de restauração florestal com intervenção humana, aponta o estudo nacional “Restauração de Paisagens e Ecossistemas”, produzido pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES) e o Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS), reunindo 45 pesquisadores de 25 instituições.

Com 40% de seu território – aproximadamente 2,1 milhões de hectares – ocupado com pastagens e monocultivos de eucaliptos, o Espírito Santo tem um vasto campo de pesquisa e planejamento para movimentar a economia de comunidades e municípios inteiros, a partir da recomposição da vegetação nativa.

 

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