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Captura de carbono com monocultura não resolve questões socioambientais, diz MPA

“Qual é a proposta maior, que realmente tem corpo no governo? O governo tem que mostrar”, pergunta o militante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) Valmir Noventa, diante da ambiguidade exposta pelo governo do Estado ao instituir o Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas Globais, na última quarta-feira (11). 

A iniciativa de ativar o Fórum, depois de seis anos paralisado, “é um passo importante, É uma ferramenta que coloca o debate na sociedade”, reconhece o líder camponês, “mas só isso não significa muita coisa”, adverte. “Precisamos de políticas efetivas de combate ao desmatamento, à desertificação e à contaminação, e que de fato restaurem parte da cobertura de vegetação nativa que existia aqui”, assevera. 

O questionamento está bem fundamentado na prática historicamente consolidada no Estado – e mantida na atual gestão de Renato Casagrande (PSB) – de incentivar a expansão da monocultura de eucaliptos, especialmente no norte e noroeste, onde o deserto verde é uma triste realidade, sendo o uso do solo que mais cresceu na última década – foram 45 mil hectares a mais entre 2007 e 2015, segundo o Atlas da Mata Atlântica do Espírito Santo – ocupando pelo menos 6,8% do território. 

Atualmente, a Suzano está em plena campanha, apoiada pela Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes), para conseguir a liberação do plantio de cinco mil hectares de eucaliptos, sendo quatro mil apenas no município de Conceição da Barra, onde a anuência foi negada em parecer técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, com base no mapeamento do uso do solo local, que apontou ser de propriedade da Suzano nada menos do que 55% do território barrense, sendo que 45% dele é ocupado pelos plantios de eucalipto propriamente ditos e por outras estruturas necessárias ao manejo da silvicultura, como estradas. 

“É contraditório, porque se apresenta essa necessidade do reflorestamento diante da grave crise do clima, que vai ser secular, não vai se resolve por pouco tempo, e que precisa de medidas estruturais. Por outro lado, o estado vem criando condições para aumentar a área de plantios de eucalipto”, expõe Valmir Noventa. 

De fato, o Poder Executivo foi autor de um projeto de lei aprovado em agosto último na Assembleia Legislativa, que cria mais compensações financeiras para a Suzano (Fibria/Aracruz Celulose). “É uma compensação dos créditos para a empresa que já paga ICMS através da Lei Kandir (lei que isenta o pagamento de ICMS sobre as exportações de produtos e serviços). O Estado está fazendo essa compensação para a empresa Fibria. No caso, ela vai fazer outra obra agora com esses créditos compensados”, defendeu, na ocasião, o vice-líder do governo, Dary Pagung (PSB).

No âmbito do Fórum Capixaba de Mudanças Climáticas Globais, o diretor-executivo do Centro Brasil no Clima (CBC), Alfredo Sirkis, um dos “padrinhos” do fórum do Espírito Santo e de outros estados da federação, afirmou, na solenidade de instituição do colegiado, que o atendimento à prioridade capixaba de “aumentar a taxa de reflorestamento” – junto de outras duas medidas urgentes, que são a substituição dos combustíveis fósseis por vegetais e a redução das emissões fugitivas de metano durante a exploração de poços de petróleo – pode se dar por meio dos chamados “reflorestamentos econômicos”, o que, no Estado, se materializa na expansão do deserto verde da multinacional papeleira. 

“O eucalipto captura muito carbono durante a fase de crescimento”, justificou o executivo, que admitiu que “não se pode fazer só reflorestamento econômico, pois traz prejuízos à biodiversidade”. O impasse, orientou, deve ser tratado dentro do Fórum, que “é exatamente o lugar para discutir esse tipo de problema, para que o governador tome decisão a partir das questões levantadas”. 

Socioambiental

Sendo ainda mais completo na análise da questão, o militante do MPA lembra que as espécies nativas, ao contrário da monocultura de eucalipto, além de recuperar a biodiversidade, “cumprem outras funções do conjunto ambiental, de permeabilizar o solo, recuperar o solo e as nascentes” e cumprem um papel social, “pois o trabalho de recuperar áreas de reflorestamento e de conservar as que existem pode envolver a comunidade, como corresponsável pelo projeto, não só na implantação, mas também na manutenção, no cuidado com o projeto, envolvendo um conjunto de pessoas também do setor de educação de todo o território”, aduz. 

José Marques Porto, membro da Câmara Técnica de Licenciamento de Grandes Projetos do Conselho Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Consema) e um dos principais articuladores da sociedade civil pela criação do Fórum Capixaba, concorda com o líder camponês: “Se é verdade que o eucalipto captura carbono no seu crescimento, também é verdade que muitas toneladas de carbono são emitidas durante a preparação do solo, do plantio e na colheita  tudo mecanizado movido a diesel sem falar de toda a energia gasta para produzir anualmente 2 milhões e 100 mil toneladas de celulose. Quero desafiar para que seja feita essa conta”, instiga o ambientalista.

“O eucalipto cumpre apenas um quesito, mas não cumpre outras questões ambientais, nem no aspecto econômico e social, ao contrário, agrava os problemas socioeconômicos”, afirma. “Hoje, a maior fonte a geração de emprego já poderia ser a recuperação ambiental. Nenhum sistema industrial tem tanta capacidade de gerar renda, mas o governo precisa colocar isso de forma prioritária”, provoca. 

O discurso está alinhado com um estudo nacional divulgado no final de agosto, que estima em 200 o número de empregos diretos gerados no trabalho de restauração de cada mil hectares de floresta. 

Os governos municipais e a sociedade também precisam assumir sua parcela de responsabilidade, complementa Valmir. “Os municípios só enxergam barragens. Quantos municípios têm um viveiro de mudas? Não conheço isso com política municipal séria”, critica.

Já os proprietários rurais, “precisam ter consciência de que a questão ambiental na propriedade dele também é responsabilidade dele”, defende. “Não precisa de uma intervenção do Estado pra fazer algumas coisas. Pra que desmatar mais? Pra que soterrar o córrego? Pra que jogar lixo no córrego? Por que usar cada vez mais agroquímicos? Precisa tomar consciência que é papel do cidadão também”, convoca. 

Nesse sentido, o apoio a movimentos sociais do campo importantes, como o MPA e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), é fundamental para frear as mudanças climáticas e solucionar problemas socioambientais tão antigos, como o esvaziamento do campo, a ameaça à soberania alimentar, a escassez hídrica, a perda de solo fértil e de biodiversidade, e o crescimento desorganizado das cidades. 

“Fazer a Reforma Agrária é esfriar o planeta. Em áreas de assentamento bem planejadas, são produzidos alimentos saudáveis, com geração de renda e riqueza para as famílias e os municípios, e há também o processo de conservação da natureza”, explana. 

Incentivo 

Nesse sentido, o deputado estadual Sergio Majeski (PSB) conseguiu aprovar, na Assembleia Legislativa, a indicação parlamentar para que o governo do Estado regulamente o Certificado Florestal (CERFLO), estabelecido no ano de 1996 na Lei 5.361, que institui a Política Florestal do Estado do Espírito Santo, mas que ainda não foi implantado no território capixaba.

Com ele em vigor, o proprietário rural que preservar ou conservar a cobertura florestal nativa existente na propriedade; ou recuperar áreas com espécies preferencialmente nativas da Mata Atlântica; ou desenvolver relevantes serviços para proteção, preservação e melhoria da qualidade de vida e do meio ambiente; ou sofrer pelo Poder Público Estadual limitação ou restrições do uso de recursos naturais existentes na sua propriedade para fins de proteção dos ecossistemas deverá receber incentivos especiais do Governo do Estado.

Ao todo são 13 incentivos especiais previstos na Lei, sendo possível identificar facilmente uma série de situações que são cobradas constantemente pelos produtores rurais.

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